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Real Encontro

Foto do escritor: Italliane MartinsItalliane Martins

Indago-lhe, quando foi a última vez em que esteve verdadeiramente na história do outro?



- Estou me sentindo perdida ultimamente, angustiada com algumas coisas...


- Nossa, eu também, ontem aconteceu uma coisa tão desagradável na minha família...


- Ah nem me fale, se está ruim para você, pense só no meu caso...


- É, quando aconteceu comigo...


O que percebes?


Noto e me assombro.


Quanta dificuldade em estar e permanecer na história do outro. Esse outro nos convoca a estarmos ativos em seus relatos, nós fugimos. Fugimos porque estamos preocupados demais com nossas questões, fugimos porque colocamos a solução antes da escuta, soltamos alguns comentários breves do tipo “é a vida né”, e avançamos desesperadamente em busca do nosso espaço, escapamos da história do outro e partimos para comunicar a nossa demanda. E o outro? Incompleto em mais um diálogo, assim como você sairá, afinal, o que esperar desse alguém que não foi escutado?


Em nossos atrasos, o tempo para o outro é escasso, na busca pela vida, nos passa despercebido o indispensável fato de que o existir só ganha sentido na relação. Corremos em busca de um “e se” e não tocamos deveras as outras pessoas, que a nós se apresenta, se apresenta por vezes com um sucinto “bom dia”, ou com um pedido de ombro camarada, ou... Ele se apresenta, de algum modo! É uma cegueira corrosiva, uma luta de pré-conceitos e respostas técnicas, e não se aprofunda na relação, na dor, na angústia, ou talvez na grandiosa alegria que eventualmente poderia ser compartilhada.


Entramos de relapso no contar do outro e nos assustamos, “putz, vai que eu me perco nisso tudo”, pudera, conhecemos cada vez menos de nós mesmos, e esse “nós mesmos” vive saltando pela goela, não o contemos e em razão disso não nos aquietamos para estar na história do outro.


Estar disponível parece distante nos tempos atuais, onde depressão e ansiedade conversam entre si. É, até elas conversam. Parece demasiado, quando o top é tirar a foto do encontro para postar. E o que não foi postado? O que não foi dito pela não escuta? O que não foi abraçado, não foi teu porque não se permitiu ser presenteado? Sim, presenteado, ouvir o outro é uma dádiva. A solidão então é procurada por muitos, por nós, só, em um universo de ouvidos, mas necessitado de ouvir. Cercado dos muitos amigos em uma luta medonha de quem falará mais de si. Pedem a pizza escolhida e enquanto a esperam, lutam pela disponibilidade do outro, mas não estão disponíveis, pois isso deverá começar de dentro.


Porque não ficar, ficar mesmo, sem urgência, achar-se ali, permanecer sem pré-conceitos, deixar a ânsia que carregava e doar-se, não pela sua medida, mas pela medida da relação, isso não o fará menor, ao contrário. Um simples indagar: como foi isso? Ou ainda: como você se sente?


O mundo precisa desse amor, amor que se dá pelo real encontro com o outro.


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